domingo, 6 de fevereiro de 2011

O caminho das pedras



Agora que o consumo do crack já chegou à classe média e faz crescente número de vítimas (além daquelas que os traficantes e os próprios viciados produzem), o governo federal finalmente diz que está tomando providências.
- Que providências? - perguntarão os eternos otimistas.
- Duas grandes pesquisas – responde o governo – sendo uma delas a maior já realizada no mundo, com mais de vinte mil usuários, para produzir enorme banco de dados sobre o vício.
Uma das pesquisas, comandada pelo Ministério da Saúde, vai traçar o perfil do usuário de crack. A outra, sob a responsabilidade da Secretaria Nacional Antidrogas, promete determinar padrões de consumo, barreiras para o tratamento e histórico social e médico de 22 mil usuários, submetidos a testes de HIV, hepatite e tuberculose.
Parece coisa de burocracia anônima e sem compromisso com resultados? Parece, sim. E é. Afinal, de que serve um banco de dados sobre hábitos de consumo, se os psiquiatras acompanham e investigam há mais de dez anos o caminho das pedras e o mal que elas produzem?
O Plano Integrado para Enfrentamento do Crack e Outras Drogas, com investimento anunciado de 410 milhões de reais em pesquisa, prevenção, combate e tratamento, deve ter umas 800 páginas de texto e nenhuma delas destinada a mudar a realidade das ruas e das prisões.
A comunidade científica vem dizendo ao governo, há vários anos, que o crack é uma droga diferente, devido ao baixo preço e por produzir dependência mais rapidamente e levar o usuário a comportamentos de risco, prostituição e atividades criminosas.
A relação entre o preço e o efeito faz do crack uma droga mais popular e de fácil acesso. E os traficantes – mais espertos que o governo – desenvolveram uma estratégia mortal de ampliação do mercado consumidor: a venda casada de maconha e crack.
Após experimentar o crack, o dependente abandona a maconha, torna-se refém do tráfico e, para manter o vício, é capaz de assaltar e matar qualquer um que apareça em seu caminho e for obstáculo à satisfação. E não há obstáculos afetivos e morais que o intimidem.
Especialistas norte-americanos calculam que cada dólar gasto no combate às drogas representa, para a sociedade, uma economia de até sete dólares em despesas com hospitais, segurança pública e acidentes de trânsito.
Entretanto, mais importante que poupar dólares ou reais é poupar vidas humanas. Condenar pequenos traficantes e usuários é fortalecer a cadeia de negócios do tráfico, pois as penitenciárias são hoje verdadeiras centrais de controle do mercado, enquanto os burocratas do governo alimentam a mídia de promessas.
São viciados irrecuperáveis, os nossos burocratas.

Tião Martins

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