quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Mulher tarja preta


A ilusão de que o Direito e as leis podem mudar a vida social e a cabeça das pessoas desaba a todo instante. Leis são importantes, claro, mas quem muda a vida e o mundo são as próprias pessoas, na sua prática cotidiana. Tomem o exemplo da Cláudia Raia, que foi inventada nos laboratórios da Rede Globo, fez sucesso e está a caminho de se tornar uma verdadeira atriz.
Apesar de tudo isso, ela está de luto, pela falência de um casamento que durou 17 anos, com o ator Edson Celulari. Aos 44 anos, parece se identificar com a patética personagem Jaqueline, que padece de solidão profunda e não suporta a si mesma. O sofrimento faz isso com as pessoas.
Em momento de rara sinceridade, pouco comum em estrelas do cinema e da TV, Cláudia teve a coragem de admitir que se sente como a personagem. “Tenho pena dela”, confessa a atriz, ao classificar Jaqueline como “mulher tarja preta, que não sabe se valorizar e é empurrada de um lado para o outro pelo mundo que a cerca”.
Cláudia confessa que não buscou a separação, ainda não se sente solteira e nem sabe se gosta do seu novo estado civil. E deixa bem clara a sua insatisfação por ser vítima de abandono, como acontece com milhares de outras que você encontra por aí.
O trabalho na TV e o aplauso do público podem atenuar o sentimento de não-existência e impedir que ela se entregue inteira ao luto, mas não há diferença essencial entre Cláudia Raia e Adélia, advogada mineira que acaba de se separar do marido e diz que “o mundo diminuiu, ficou mais pesado e parece não oferecer saída”.
Aos 45 anos, apenas um a mais que a atriz, Adélia teme se tornar refém de uma sociedade que ainda hoje encara o divórcio como fracasso pessoal da mulher e atribui a ela a culpa de não saber “segurar o marido”:
- Gostei quando Cláudia Raia falou das mulheres “tarja preta” ou que fazem papel de poodles na vida. Essas vivem deprimidas, aceitam ser as pobrezinhas da família e renunciam a tudo. Não vou cair nessa armadilha. Já deixei isso bem claro, para meus pais e minha sogra.
Ora, se essa mulher, aos 45 anos de idade, ainda precisa prestar contas a duas famílias, o que mudou, afinal, nos últimos cem anos?


Tião Martins

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