terça-feira, 11 de janeiro de 2011

“Tinha lido que na prisão se acaba perdendo a noção do tempo. Mas, para mim, isto não fazia sentido. Não compreenderá ainda até que ponto os dias podiam ser ao mesmo tempo, curtos e longos. Longos para viver, sem dúvida, mas de tal modo distendidos que acabavam por se sobrepor uns aos outros e nisso perdiam o nome. As palavras ontem e amanhã que conservavam um sentido para mim.
Quando um dia, o guarda me disse que eu estava lá há cinco meses, acreditei, mas não compreendi. Para mim era sempre o mesmo dia, que se desenrolava na minha cela, e era sempre a mesma tarefa, que eu perseguia sem cessar. Nesse dia, depois de o guarda ter saído, olhei-me na bacia de ferro. Pareceu-me que a minha imagem ficava séria, mesmo quando tentava sorrir para ela. Agitei-a diante de mim. Sorri, e ela conservou o mesmo ar severo e triste. O dia acabava e era a hora de que não quero falar, a hora sem nome, em que os ruídos da noite subiam de todos os andares da prisão, num cortejo de silêncio. Aproximei-me da janela e, à última luz, contemplei uma vez mais a minha imagem. Continuava séria, e que há de espantoso nisso, se nesse instante eu também estava sério. Mas no mesmo tempo, e pela primeira vez nos últimos meses, ouvi distintamente o som da minha voz. Reconhecia-a como a que ressoava há longos dias aos meus ouvidos e, compreendi que, durante este tempo, falara sozinho. Lembrei-me, então, do que dizia, e ninguém pode imaginar como que são as noites na prisão.”


 
Albert Camus

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