segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

A crônica dos prazeres


Séculos de martírio religioso e ideológico criaram na cabeça dos humanos uma tremenda confusão de sentimentos. O nó é tão apertado e difícil de desatar que são raros os casais capazes de viver – por um longo tempo – amor e amizade, amor e alegria, amor e erotismo. Nosso jeito confuso de olhar para o amor chega às vezes a negar a compatibilidade entre amizade e sexo, como se fossem relações opostas. E até as novas gerações, menos torturadas que as anteriores, enfrentam esse dilema inexistente.
- Jamais faria sexo com um amigo, para não correr o risco de perder sua amizade – diz a menina de 25 anos, sem perceber que as palavras mudaram, mas o preconceito seria endossado em público por sua bisavó.
Por que razão o encontro sexual mataria a amizade ela não sabe dizer, mas lá no fundo da mente separa a amizade do prazer. É como se o amigo fosse igual a um irmão de sangue, com o qual não é admissível uma relação erótica.
Entretanto, se observarmos o espaço que existe entre o interdito e a realidade, descobriremos que acontecem mais coisas entre o céu e a terra do que imagina a nossa vã filosofia. Hoje talvez até nem tanto, mas antigamente – na idade em que meninas e meninos começam a descobrir a sexualidade – os parceiros mais próximos eram os primos e os melhores amigos.
As piadinhas imortais sobre “brincar de médico” nasceram nessa época e tiravam o sossego dos pais, que a cada cinco minutos iam investigar se os brinquedos já haviam se transferido para o “consultório”. Hoje, essas antigas meninas sentem gratidão pelo que puderam ensinar aos primos e amigos dos seus irmãos (ou aprender com eles) e entendem que a amizade não é inimiga do amor. Ao contrário, sabem que a relação ideal entre homem e mulher é aquela que evolui da admiração, amizade e afeto para o erotismo e o prazer, sem perder nada pelo caminho.
Muitas amigas já confessaram que teriam se casado com seus primos, se não fosse a objeção da família. Outras – em momentos de angústia e solidão – procuram um amigo e dizem claramente que desejam mais carinho do que se pode dar ou receber em um bate-papo. Nem sempre o amigo aceita o convite, mas nos casos em que se dá o encontro erótico – elas revelam – há mais liberdade, intimidade, entendimento e carinho que em suas experiências com os namorados.
Mas elas ensinam também que homem e mulher devem ter clareza sobre o que vão viver. Com esse cuidado, garantem, ninguém embarcará na ilusão de que essas horas de prazer vão se repetir pela vida inteira. Pode acontecer, claro, mas pode não acontecer.
- Amigo é amigo, não é pau pra toda obra – disse uma delas, com sorriso esperto. – O ideal é que o homem, marido ou não, seja um amante maravilhoso e um amigo de todas as horas.



Tião Martins

2 comentários:

  1. Gostei desta sua teoria.

    Beijo.

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  2. Seria o ideal... Pena que na maioria das vezes não acontece assim. Com o tempo o prazer sexual é substituído por outros prazeres não menos prazerosos que o sexo, só diferentes. Existem pessoas que conseguem fazer de uma amizade, um amor, um amante. Eu, sinceramente, não conheço. Na minha família existem muitos primos casados com primos e pasmem, até tio casado com sobrinha, mas para mim, meu primos e amigos sempre foram como irmãos. Mas eu acredito que relações nascidas de uma amizade têm mais chances de durar do que relações começadas por atrações físicas. Com o tempo o tesão passa e amizade e companherismo passam a ser mais importantes do sexo.

    Uma boa semana!

    Malu

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